ÁREA 1: ECONOMIA BAIANA
COTAS E DESEMPENHO NA UNIVERSIDADE
FEDERAL DA BAHIA: UMA ANÁLISE DOS INGRESSANTES DE 2010 A 2012
AUTORES
Juliana Lago
Profa
Adjunta da Faculdade de Economia da UFBA –
cmalbo@ufba.br – Praça 13 de maio, nº6, sala 408, Piedade –
(71) 3283-7509
Vinicius Felipe da Silva
Mestranda
em Economia PPGE/UFBA
- ivanessatnc@gmail.com – Av. Cardeal da Silva, nº155, Bl. Cardeal,
apto 108, Federação – (71) 9324-1935
COTAS E DESEMPENHO NA UNIVERSIDADE
FEDERAL DA BAHIA: UMA ANÁLISE DOS INGRESSANTES DE 2010 A 2012
RESUMO
A discussão a
cerca do impacto das ações afirmativas sobre o desempenho acadêmico dos alunos
no ensino superior tem recebido cada vez mais atenção na literatura,
principalmente quando considerados os problemas na formação básica de boa parte
desses alunos. O reconhecimento amplo de que a educação gera benefícios para os
indivíduos e sociedade reflete-se na formulação e execução das políticas públicas
educacionais. No ensino superior público, as políticas de ações afirmativas no
acesso visam reduzir as desigualdades e inclusão social nas universidades. O objetivo deste
trabalho é analisar o impacto da Política de Cotas na nota media semestral dos
46.011 alunos matriculados na Universidade Federal da Bahia que ingressaram por
Vestibular nos anos 2010, 2011 e 2012. Para tanto, utilizou-se o método dos
Mínimos Quadrados Ordinários com dados agrupados para estimar o impacto de ser
cotista sobre a nota média semestral em comparação com os alunos não
cotistas. Os resultados indicam que, em
geral, os cotistas têm notas menores que os não cotistas.
PALAVRAS-CHAVES:
Economia da Educação. Ação Afirmativa. Nota Média Semestral.
1. INTRODUÇÃO
Diversos
países ao redor do mundo aplicam alguma política de ações afirmativas para
educação como forma de permitir o acesso de grupos da sociedade que tem sido
historicamente discriminados e mantidos a parte do processo de formação de
capital humano da sociedade. No Brasil a política de ações afirmativas data do
início dos anos 2000 e tem sido construída com objetivo de reduzir a
desigualdade entre grupos da sociedade, mas também como forma de um resgate
histórico das minorias à margem do processo educacional.
No
Brasil, as ações afirmativas se traduzem em medidas de acesso e de permanência
nas Universidades Públicas. No que se refere ao acesso, o sistema de reserva de
vagas no ensino superior teve seu inicio de forma isolada em algumas
Instituições públicas de ensino superior como a UERJ em 2004 e a Universidade
Federal da Bahia em 2005. Os objetivos desta são de reduzir a desigualdade na
sociedade e promover a inclusão de grupos minoritários na educação superior,
que tem historicamente sido mantida fora desta etapa da educação. No Brasil o
critério para participação neste tipo de política envolve, além de critérios
raciais, critérios socioeconômicos, como ter feito o ensino médio completo na
rede pública. Embora não seja adotado um critério exclusivamente racial, parte-se
do reconhecimento de uma dívida histórica com os afrodescendentes e grupos
sociais em situação de desvantagem em relações aos demais na sociedade.
Os
efeitos da política de ações afirmativas tem sido discutido de forma crescente
na literatura e sob diferentes aspectos. De acordo com Bertrand, et all (2010),
o debate está centrado em duas questões principais, quais sejam, alcance e
efeitos da política
.
A primeira trata a questão de quem este programa realmente atinge, ou seja, se
o publico alvo das ações afirmativas são os verdadeiros beneficiários. A
segunda questão é se e quanto desse programa realmente ajuda aqueles que têm
acesso á universidade somente na condição de beneficiários do programa. Esta
questão é conhecida na literatura como
mismatch
hypothesis.
A
hipótese de
mismatch foi
primeiramente apresentada por Sander (2004), que analisou o desempenho de
alunos negros beneficiários das ações afirmativas nas escolas de direito dos
EUA. De acordo com Arcodiciano (2011) a literatura sobre
mismatch tem focado na comparação de resultados de estudantes em
desvantagem matriculados em universidades de ponta relativo ao resultado
correspondente contrafactual
quando estes estudantes se encontram em universidades de menor prestígio nos
EUA.
Sob
a hipótese de mismatch, os programas
de ação afirmativa colocam grupos minoritários em um ambiente acadêmico para o
qual não estão preparados, de modo que os beneficiários dos programas tem
desempenho inferior ao dos demais colegas da turma, tendo maior probabilidade
de abandonar o curso e não conseguir se inserir no mercado de trabalho. No pior
dos cenários, a ação afirmativa pode realmente fazer com que este grupo
sinta-se pior, seja pelo tempo perdido que passou na faculdade ou por de um
efeito de desânimo (ARCODICIANO, et all, 2011).
Os
defensores da política argumentam que tais programas podem resultar em ganhos
líquidos para os grupos desfavorecidos e para a sociedade. De acordo com
Arcidiacono, et all (2011), os favoráveis às ações afirmativas argumentam que admissões
na universidade baseada na raça são importantes tanto para ajudar minorias a
superar o legado da discriminação institucionalizada quanto para os estudantes
majoritários que recebem benefícios da diversidade inter-racial nas turmas.
A
despeito da relevância e da crescente discussão sobre o tema, a literatura
sobre os efeitos das ações afirmativas no Brasil ainda é bastante reduzida
. Este
trabalho enquadra-se nesta temática e busca analisar se existe diferencial de desempenho
entre alunos beneficiários do sistema de reserva de vagas e os demais na Universidade
Federal da Bahia por grandes áreas de conhecimento. Para tanto foram
considerados todos os alunos ingressantes por vestibular matriculados nos anos
de 2010 a 2012. Os dados são provenientes do Sistema Acadêmico da UFBA e do
questionário socioeconômico respondido pelos candidatos no momento da inscrição
no vestibular. A análise foi feita por MQO agrupado.
O
restante deste trabalho está organizado como segue. Na seção 2 faz-se uma breve
apresentação das políticas de ações afirmativas para o ensino superior,
incluindo definição, origem e evolução no Brasil, é apresentado, também o
sistema de reserva de vagas na UFBA e a lei federal que estabeleceu 50% das
vagas das universidades federais para ações afirmativas. A seção 3 apresenta uma
rápida revisão da literatura e o modelo teórico adotado para análise. A seção 4
apresenta descrição dos dados utilizados e resultados das estimações. A seção 5
apresenta as considerações finais.
2. Ações
afirmativas
De
acordo com o GEMAA (2013), ações afirmativas consistem em uma forma de alocar
recursos para grupos excluídos, discriminados e/ou vitimados devido a
características socioeconômicas, questões étnicas, raciais, religiosas, de
gênero ou de castas no passado ou presente. Basicamente, Políticas de Ações
Afirmativas referem-se ao conjunto de medidas que garantem a participação
desses grupos no acesso a serviços básicos como educação, saúde, emprego e
processo político (GEMAA, 2013).
Para Silva
Filho e Cunha (2013) as ações afirmativas podem ser compreendidas como ações
compensatórias e que buscam a correção de uma situação de discriminação e
desigualdade em que se encontram determinados grupos sociais. As ações
afirmativas se baseiam no fundamento de que há uma dívida histórica com relação
a grupos considerados minoritários e, por isso, as políticas públicas devem
também ser voltadas para a reparação das desigualdades (idem, p. 1).
Holzer
and Neumark (2000) colocam que as ações afirmativas podem ser diferenciadas de
outras medidas antidiscriminatórias pelo requerimento de passos proativos (e
por isso o termo “afirmativo") para eliminar diferenças entre grupos da
sociedade, em contraste às leis especificas que evitam discriminação direta,
como no caso da preferência de raça na contratação para um emprego.
Nessa
mesma linha, Sander e Taylor (2012) colocam que o termo ação afirmativa se
refere a esforços proativos para prevenir discriminação contra minorias e
promover uma verdadeira igualdade de oportunidades por assegurar que os
procedimentos de seleção são justos e pelo uso de divulgação e recrutamento
para corrigir padrões passados de exclusão. Os autores chamam atenção para a
diferença do termo preferência racial que, em contraste, descreve programas que
alocam admissões universitárias ou outras oportunidades baseadas parcialmente
na raça do candidato
.
Para
Fryer e Loury (2005) a política de ações afirmativas regula a alocação de
posições escassa na educação, emprego ou negócios de modo que aumenta a
representação nessas posições de pessoas pertencentes a certos subgrupos da
população. De acordo com os autores tais políticas são bastante controversas.
A
definição do caráter ativo das ações afirmativas é elemento fundamental pra que
o conjunto de medidas abarcadas sob esta definição se diferencie de mecanismos
que considerem apenas o critério de preferência racial. A perspectiva de que
padrões históricos de discriminação e exclusão de grupos da sociedade não podem
simplesmente ser eliminados por garantias de acesso a estes grupos específicos
é central para o sucesso da política. No que se refere à ações afirmativas na
Educação Superior, deve-se ter claro que uma política ou programa de ações
afirmativas refere-se a um conjunto de ações e medidas voltadas não apenas para
o acesso, mas também para a permanência e posterior inserção no mercado de
trabalho. Partindo deste enfoque, este trabalho analisa um dos mecanismos que
compõem o conjunto das ações afirmativas, qual seja o sistema de reserva de
vagas da UFBA, conforme será detalhado mais adiante.
Dependendo
das características particulares da história de cada local em que foram
adotadas, as políticas de ações afirmativas variavam o campo de atuação entre
mercado trabalho, representação política e sistema educacional, assim como as
características do público-alvo atendido (MOEHLECKE, 2012). No entanto, o papel desempenhado
por elas em todos os contextos se enquadra como uma forma de inclusão da
parcela vulnerável, minorias, em que são usualmente excluídas (AGOSTINHO; BREGA
FILHO, 2011). Dentro da educação, devido à relevância desta na vida do indivíduo,
estas políticas tornam-se uma
ferramenta de política social, em que o Sistema de Cotas, apesar de não ser o
único, é a forma mais conhecida dessa política na educação superior do Brasil
(PERREIRA, 2013).
No
ensino superior público, as ações afirmativas se manifestam, em geral, no
acesso à graduação por meio de reservas de vagas, sistema de cotas ou
bonificação, e no sentido de permanência por meio de auxílio financeiro. No
entanto, um conjunto adicional de ações podem ser consideradas como elementos
integrantes do programa. Em alguns casos, as instituições de ensino pode até
mesmo realizar ações pré-ingresso e pós-permanência. As primeiras são voltadas
para o ensino médio com o intuito de melhorar a qualidade dos prováveis
candidatos à admissão nestas instituições
. As
segundas seriam ações voltadas para inserção dos egressos no mercado de trabalho.
As
ações afirmativas para o acesso podem ser aplicadas por diferentes mecanismos.
A mais discutida na literatura é a seleção dos grupos alvo, ou seja, aqueles
que se encontram em desvantagem, por critério de raça. Este tipo de ação
afirmativa é muito comum nos EUA, ainda que esteja se reduzindo
consideravelmente ao longo dos últimos anos
(KRISHNA
e TARASOV, 2013). De forma resumida, a preferência racial na seleção dos grupos
em desvantagem pode ser vista pelo estabelecimento de um determinado nível de
presença dos grupos minoritários da sociedade, ou seja, cotas.
A
seleção pode ainda ser realizada com base em um critério de bônus: os candidatos
do grupo em desvantagem recebem um bônus (nota adicional ou percentual) sobre
sua nota de ingresso na Universidade. Um terceiro critério de seleção seria o
estabelecimento de um ponto de corte nos exames para ingresso nas Instituições
de Ensino Superior diferenciado para o grupo em desvantagem. Estes dois últimos
critérios podem também ser vistos como mecanismos que permitem algum tipo de
concorrência ex ante entre os potenciais beneficiários da política. Em geral, o
que se observa é que as políticas adotadas não são exclusivamente baseadas em
preferências raciais, mas fazem um mix do critério de preferência racial com
sistema de concorrência entre os beneficiários da política.
A
primeira vez que o termo “ação afirmativa” apareceu foi nos Estados Unidos em
1935 na legislação trabalhista, mas somente após o Movimento dos Direitos Civis
o sentido foi tomando a forma atual (GEMAA, 2013). Estas políticas se
consolidaram e foram efetivamente aplicadas nos anos 60, no contexto de
reivindicações democráticas internas expressas pelo movimento dos direitos
civis, que buscava a igualdade e oportunidade de todos, resultando na gradativa
eliminação de leis segregacionistas e fortalecimento do movimento negro
(MOEHLECKE, 2002).
As
ações afirmativas não ficaram restritas aos Estados Unidos, mas se espalharam
para a Europa e países como, Índia, Paquistão, Austrália, África do Sul e
Brasil, dentre outros
.
De acordo com Santos (2012), se observado que as ações afirmativas são medidas,
políticas e programas dirigidos a grupos e populações que estão vulneráveis a
processos de discriminação, diversos países na atualidade realizam algum tipo
de programa de ações afirmativas, como a Bósnia, China, Macedônia, Nova
Zelândia, Eslováquia e Reino Unido
.
Na
Índia, as ações afirmativas se estabeleceram para garantir os direitos das
chamadas “castas inferiores”, as quais eram impedidas de residir nas mesmas
áreas, usar as mesmas fontes de água e até mesmo frequentar os mesmos templos
dos demais indianos, assim foram introduzidas garantias constitucionais para
cargos no governo, serviço público e educação (GEMAA, 2013). É importante
ressaltar que o ano de aplicação das Ações Afirmativas na Índia é datado de
1948, entretanto a literatura costuma ressaltar a experiência na história
americana e posterior difusão pelo mundo.
De acordo com Santos (2012), a Malásia adotou as ações
afirmativas com a instituição de um sistema de cotas em 1971 para os malaios e
determinadas tribos que se encontravam em desvantagem socioeconômica perante os
chineses e indianos.
Na
África do Sul, desde 1993, estas políticas foram aplicadas para mulheres,
deficientes físicos e negros, sendo estes últimos vítimas de um sistema
segregacionistas até o início dos anos 90, o que é utilizado como justificativa
da necessidade dessas medidas. Os tipos de sistema adotados consistem em cotas,
financiamento e metas de inclusão, em que nas universidades públicas utilizam
metas de inclusão e que se não forem cumpridas acarretam em sanções por parte
do governo (GEMAA, 2013).
No Brasil, as políticas de ações afirmativas
surgem no contexto social de medidas redistributivas ou assistenciais aos
grupos excluídos, tendo na década de 90 a primeira política de cota nacional
através da lei que institui que os partidos políticos tivessem uma cota mínima
de mulheres candidatas (MOEHLECKE, 2012). A primeira experiência com Ações Afirmativas nas
universidades brasileiras públicas ocorreu no Rio de Janeiro através da adoção
de cotas raciais para negros e indígenas na Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (UERJ) e na Universidade do Norte Fluminense (UENF) em 2001,
posteriormente outras universidades como a Universidade do Estado da Bahia
(UNEB) e a Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul (UEMS) também reservaram
um percentual de vagas para afrodescendentes e indígenas (HERINGER; FERREIRA,
2009).
A Universidade Federal da Bahia (UFBA) adotou o
sistema de reserva de vagas, também conhecido como sistema de cotas, para os
ingressantes no vestibular de 2005, em julho de 2004, através da
resolução n°01/04 elaborada pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão
(CONSEPE). A política de cotas estabelece que
45% (quarenta e cinco por cento) das vagas deveriam ser reservadas para
estudantes oriundos de escolas públicas que se declarassem preto, pardo ou
indígena. A política de cotas na UFBA foi fruto da conjuntura nacional e
internacional que debatiam sobre a necessidade de reparação da exclusão sofrida
pelos negros ao longo história (QUEIROZ; SANTOS, 2006).
A
Lei nº 12.711/2012, sancionada em agosto de 2012, mudou o panorama do sistema
de reserva de vagas, tornando obrigatória a adoção do sistema por todas as
Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), englobando um total de 59 universidades federais e 38 institutos federais
de educação ciência e tecnologia. A lei determina que 50% das matrículas
das universidades e institutos federais sejam destinadas a alunos que
frequentaram o ensino médio em colégios públicos e a outra metade a ampla
concorrência. A UFBA adotou a “Lei de
Cotas” já para os ingressos no vestibular de 2013.
Heringer e Ferreira (2009) pontuam que a grande
maioria das universidades públicas escolheram o sistema de reserva de vagas e
que apenas uma parcela reduzida preferiu o sistema de bonificação por pontos.
O sistema de reserva de vagas também
chamado de sistema de cotas consiste em reservar um percentual de vagas,
em relação à quantidade total, para ser ocupada por um grupo com
características definidas (MOEHLECKE, 2012). O sistema de bonificação por pontos
promovia um acréscimo determinado de pontos na nota final do vestibular de
acordo com as características do grupo beneficiado pela Política de Ação
Afirmativa.
As ações afirmativas nas universidades
brasileiras se destinavam a públicos distintos. O principal critério era ter
estudado o ensino médio em escola pública, agregado a outros critérios, como
raça e etnia, renda, ser deficiente, entre outros. As universidades brasileiras
tinham autonomia para escolher se iriam utilizar algum tipo de ação afirmativa
no acesso e quais os percentuais utilizados.
Na região Sudeste, a Universidade Federal Fluminense (UFF), a Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp) e a Universidade do Estado de São Paulo (USP) utilizavam o
sistema de bônus. Na UFF um bônus de 10% é adicionado na nota do candidato
oriundo de escola pública, na Unicamp os estudantes de escola pública recebiam
um adicional de 30 pontos e os afros descentes de 40 pontos na nota do vestibular.
Na USP a pontuação da primeira e segunda fase é acrescida em 3% para estudantes
da rede pública. As demais universidades da região adotaram o sistema de cotas.
No Centro-Oeste, a Universidade de Brasília
(UNB) reservava 20% das vagas para negros, a Universidade Estadual de Goiás
(UEG) reserva 20% de vagas para afro descendentes, 20% para estudantes que
cursaram o ensino médio em escolas públicas e 5% para índios e portadores de
necessidades especiais e a Universidade Federal de Goiás (UFG) reservava 10%
para alunos oriundos de escolas públicas e 10% para afros descendentes.
Na região Norte, a Universidade Federal do
Pará (UFPA) reserva 50% das vagas para estudantes de escolas públicas, em que
40% são destinadas para afro descendentes, enquanto a Universidade Federal da
Amazônia (UFRA) reserva vagas proporcionais aos inscritos oriundos de escolas
públicas e a Universidade Federal do Tocantins (UFF) 5% das vagas são
destinadas aos índios.
Na região Sul, a Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC) estabelecia 20% das vagas para estudantes de escolas públicas e 10% para
negros que também frequentaram escolas públicas; a Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS) estabelecia 30% das vagas para alunos negros e que são
oriundos de escolas públicas e a Universidade Federal do Paraná (UFPR) 20% para
estudantes negros, 20% para oriundos de escolas públicas e sete vagas para
indígenas.
No Nordeste, a Universidade Federal do
Alagoas (UFAL) reservava 20% das vagas para negros distribuídos em 60% para
mulheres e 40% para homens, a Universidade Federal de Sergipe (UFS) destinava
50% para estudantes de escolas públicas e a Universidade Federal do Piauí
(UFPI) destinava 5% das vagas para estudantes que cursaram o ensino fundamental
e médio em rede pública. A Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN),
a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e a Universidade Federal Rural de
Pernambuco (UFRPE) eram as únicas universidades da região que adotavam o
sistema de bônus.
Na Bahia, a Universidade Federal do Recôncavo
Baiano (UFRB) reservava 45% das vagas para estudantes de instituições públicas.
A Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), a Universidade Estadual de
Santa Cruz (UESC) e a Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) adotavam
um sistema de cotas em que 50% das vagas eram destinadas para estudantes de
escolas públicas e na Universidade do Estado da Bahia (UNEB) 40% das vagas
estavam reservadas para negros oriundos de escolas públicas.
Desde 2001, as ações afirmativas vêm se estabelecendo e garantindo o acesso
de determinados grupos nas universidades públicas federais e estaduais
brasileiras. Em agosto de 2005, sete universidades federais e nove estaduais já tinham
adotado percentuais de ingresso para estudantes de escola públicas, negros e
indígenas (QUEIROZ; SANTOS, 2006). Antes da Lei nº 12.711/2012 ser
sancionada, setenta e nove instituições
de ensino superior utilizavam ações afirmativas.
A
Lei nº 12.711/2012 determina que 50% das matrículas das universidades e
institutos federais sejam destinadas a alunos que frequentaram o ensino médio
em colégios públicos e a outra metade a ampla concorrência. Sancionada em agosto de 2012, a lei engloba 59
universidades federais e 38 institutos federais de educação ciência e
tecnologia, os quais deverão aplicá-la gradativamente. Entretanto para o
ingresso no vestibular de 2013, as universidades já deveriam reservar 12,5% das
vagas ofertadas e as que já desenvolviam Ações Afirmativas poderiam mantê-las,
contanto que cumprissem o percentual mínimo (PORTAL MEC, 2013). A “Lei
de Cotas” funcionaria de acordo com o diagrama abaixo:
Figura 1 - Diagrama da Lei nº 12.711/2012
Fonte: Ministério da Educação (2013)
No exemplo para o estado do Rio de
Janeiro, em que 51,80% da população se declararam preto, pardo ou indígena, um
curso com a quantidade total de 100 vagas, conforme o esquema acima, 50 vagas
para alunos de escola pública e 50 vagas de ampla concorrência. Dentro do
primeiro grupo, 25 vagas para alunos com renda menor que um salário mínimo e
meio e 25 vagas para alunos com renda maior que um salário mínimo e meio. E
dentro de cada subgrupo seriam destinadas 13 vagas para negros, pardos e
indígenas e 12 vagas para os demais (PORTAL MEC, 2013).
No
que se refere à Universidade Federal da Bahia, Almeida Filho et all (2005) colocam
que o Programa de Ação Afirmativa da UFBA é destinado às populações socialmente
carentes, afrobrasileiros e ameríndios e está estruturada em quatro eixos,
quais sejam, preparação, ingresso, permanência, graduação. O primeiro eixo
refere-se às ações adotadas que buscam influenciar positivamente a qualidade
das escolas públicas na Bahia, melhorando dessa forma qualificação de seus
egressos como candidatos ao vestibular. Exemplos das medidas adotadas por esse
eixo são os programas para ampliação de licenciaturas para a formação de
docentes para ensino público fundamental e médio e acordos e convênios com
organizações governamentais não governamentais que realizam trabalhos sociais
com grupos socialmente carentes.
O
segundo eixo trata-se propriamente do ingresso na Universidade e é composto por
três ações (ALMEIDA FILHO et all, 2005, p. 16): redução da taxa e inscrição do
vestibular e ampliação da isenção concedida a alunos socialmente carentes
(egressos de escolas públicas), ampliação do número de vagas para cursos de
graduação (vagas residuais, novos cursos e novas vagas em cursos
pre-existentes), e sistema de cotas para alunos pobres, negros e índiodescendentes.
O
terceiro eixo é voltado para a permanência dos alunos e incorpora três medidas:
revisão da grade de horários de modo a permitir a combinação entre estudo e
trabalho; implementação de um programa amplo de tutorial social, reforço
escolar e acompanhamento acadêmico que atenda a todos os estudantes que
demandarem, independente de terem ingressado pelo regime de cotas ou não; a
ampliação da capacidade de atendimento dos programas de apoio estudantil, com
mais bolsas de trabalho, bolsas residência e auxílio alimentação.
O
quarto eixo trata do fomento a conclusão os cursos e preparação para o mercado
de trabalho para alunos socialmente carentes afrobrasileiros e índiodescendentes,
por meio de assessoria e assistência na obtenção de estágios e empregos, e um
programa de educação permanente para aqueles que se tornarem pequenos empresários.
Para este eixo além da participação do MEC, a participação do MTE e do SEBRAE
também estavam prevista como parceiros na execução das ações.
No que se refere ao sistema de reserva de
vagas, Queiroz e Santos (2006) assinalam que a política de reserva de vagas na
Universidade Federal da Bahia foi fruto da conjuntura nacional e internacional
que debatiam sobre a necessidade de reparação da exclusão sofrida pelos negros
ao longo história. Eles afirmam que a primeira proposta para o estabelecimento
de cotas ocorreu em 2002 através do intermédio de um grupo de estudantes
negros, porém a política só se tornou efetiva em 2005. A forma de ingresso na
universidade mudou com a adoção de reservas de vagas, pois o sistema
tradicional considerava exclusivamente o desempenho na primeira e segunda fase
do vestibular, não importando variáveis como origem escolar, renda e cor na
seleção (QUEIROZ; SANTOS, 2006).
O sistema de cotas da UFBA estabelecia que
45% (quarenta e cinco por cento) das vagas seriam reservadas e distribuídas da
seguinte maneira: 36,65% das vagas seriam reservadas a estudantes oriundos de
escolas públicas que se declararem negros ou pardos; 6,45% para estudantes de
escolas públicas de qualquer cor; 2% para estudantes de escolas públicas que
fossem declarados indígenas (UFBA, 2013). A Resolução 01/2004, que alterou a
Resolução 01/2002 do CONSEPE, incluía que o estudante deveria ter cursado pelo
menos uma série do fundamental em escola pública.
A UFBA tem seis categorias de cotas
detalhadas da seguinte maneira: Categoria
A: candidatos de escolas públicas que se declararam pretos ou pardos; Categoria
B: candidatos de escolas públicas de qualquer etnia ou cor; Categoria C: sem
cotas, candidatos de escolas particulares que se declararam negros ou pardos;
Categoria D: candidatos de escolas públicas que se declararam índios; Categoria
E: sem cotas, todos os candidatos independentes de etnia ou cor; Categoria F:
candidatos de escolas públicas aldeados ou quilombolas.
Se as vagas destinadas a categoria A e B não forem
preenchidas, elas devem ser destinadas para a categoria C. Permanecendo
incompletas, elas devem ser preenchidas por candidatos da categoria E, ou seja,
a categoria A é subconjunto de B, que é subconjunto de E. O mesmo ocorre para a categoria D, que se não
tiver completado todas as vagas devem ser transferidas para a categoria E.
Com a sanção da “Lei de Cotas”, a UFBA
reabriu as inscrições do vestibular para o ingresso em 2013, a fim de se
adequar de imediato a nova resolução. Desse modo, tornou-se dispensável a
exigência de ter estudado um ano do ensino fundamental em escola pública como
vigorava anteriormente, tendo como critério único para se enquadrar no sistema
os pré-requisitos exigidos por lei.
3. EFEITOS DAS AÇÕES AFIRMATIVAS NO ENSINO
SUPERIOR: EVIDêNCIAS EMPÍRICAS
Na
literatura, teórica e empírica, não existe um consenso a cerca dos impactos
das Ações Afirmativas dentro das universidades
. Francis
e Tannuri-Pianto (2012) colocam que artigos teóricos propõem justificativas de
eficiência para manter ou descartar admissões no ensino superior por preferências
raciais.
Fryer
e Loury (2005) colocam que é teoricamente possível que a existência das ações
afirmativas possam reduzir o esforço e aquisição de qualificação no grupo alvo
porque a política poderia tornar esse esforço e aquisição menos importante para
alcançar resultados de sucesso. Por outro lado, poderia aumentar os incentivos
para o grupo-alvo, dado que as oportunidades criadas pelas ações afirmativas,
antes fora do alcance deste grupo, torna-se acessível de modo que o esforço
para prosseguir torna-se totalmente válido.
Conforme
aponta Perreira (2013), parte da literatura defende que o sistema de reserva de
vagas
como
forma de reparação histórica e identificam resultados positivos sobre os
beneficiados por essas políticas na universidade. Em geral, o entendimento é de
que as ações afirmativas contribuem para a diminuição das desigualdades
existentes entre os diferentes grupos raciais no que diz respeito tanto ao
acesso à educação superior quanto no mercado de trabalho, na medida em que
permite ao grupo em desvantagem uma intensificação do processo de acumulação de
capital humano que não ocorreria na ausência da política
.
De
acordo com Fryer e Loury (2005) muitos defensores da política acreditam que,
independente dos custos associados, as ações afirmativas podem sempre ajudar
seus beneficiários, “that is, it is better to attend an institution
because of preferencial treatment than not to attend” (p.159). Os autores
ainda colocam que os defensores da política argumentam que as minorias
admitidas sob a ação afirmativa são mais prováveis de se beneficiar das
inúmeras externalidades acadêmicas, sociais e de rede que existem em
instituições seletivas.
Su (2005) defende as políticas de ações afirmativas
colocando que estas promovem a igualdade racial. O grupo desfavorecido tem menos
oportunidade de desenvolvimento, no que tange o acesso à educação baseado
somente em pontuação, pois se trata de um grupo historicamente excluído, tornando
necessária uma política de intervenção. A autora diz também que a ação
afirmativa não significa perda de eficiência da universidade, visto que há um
aumento da competitividade entre os estudantes pela vaga, acarretando o aumento
do esforço e capital humano beneficiando a todos.
Outra
parte da literatura identifica um efeito predominantemente negativo sobre os
beneficiários das ações afirmativas. O debate sobre os efeitos da política foi fortemente
influenciado pelo trabalho de Sander (2004) que discutiu e testou a hipótese de
mismatch. De acordo com Sander, que
este tipo de mecanismo ao invés de permitir a formação de capital humano para
grupos historicamente em desvantagem, gera um efeito inverso em virtude do gap
pré-existente à entrada na universidade. Assim é que, tem-se como resultado uma
elevada taxa de reprovação e abandono dos beneficiários dessa politica
.
Em
geral, o efeito de mismatch ocorre
porque os alunos não estão preparados de forma suficiente para acompanhar os
cursos do qual participam, ou seja, acabam sendo inseridos em ambientes no qual
se sentem sobrecarregados. Nesta perspectiva, os alunos que estão menos
preparados, relativamente aos demais colegas, iniciam sua trajetória acadêmica
com déficits, atrás dos demais, e ficam cada vez mais perdidos à medida que o
curso avança. Sander e Taylor (2012) colocam ainda que o efeito de desanimo e
consequente abandono da universidade pode ter forte impacto ao longo da vida
destes indivíduos, o que seria ainda mais preocupante.
De
acordo com Arcidiacono et all (2012), a literatura sobre mismatch tem focado na comparação entre estudantes minoritários
matriculados em universidades de elite relativo ao resultado contrafactual
correspondente quando estes estudantes minoritários estão matriculados em
universidade menos seletivas.
Um
aspecto que está por detrás da hipótese de mimatch
é que o processo educacional é inerentemente hierárquico, ou seja, a formação
do conhecimento é feita de forma sequenciada, de modo que não é possível
atingir estágios mais avançados sem ter passados pelos estágios básicos da
formação. Como coloca Su (2005), a natureza hierárquica do processo educacional
implica que etapas mais avançadas somente podem ser alcançadas se as etapas
iniciais forem concluídas, e quanto melhor o desempenho no ensino básico,
melhor a eficiência de aprendizagem no ensino superior. Então, se dificuldades
de aprendizado são observados no ensino médio, certamente impactará no ensino
superior.
Um
segundo tipo de crítica à política é feita por Sowell (2004). De acordo com o
autor, esse tipo de política, de caráter temporário, não diminui as
desigualdades, dada uma longa trajetória de desigualdade condicionada por uma
enorme gama de fatores históricos, culturais, geográficos, demográficos, dentre
outros, que molda habilidades específicas, hábitos e atitudes dos diferentes
grupos da sociedade. Nesse sentido, existe um gap pré-existente na formação escolar entre beneficiários e não
beneficiários que acarreta uma perda na qualidade do capital humano das
universidades.
Com
relação à literatura empírica, Francis e Tannuri-Pianto (2012) identificam que
a maioria dos trabalhos é sobre os EUA, embora muitos estudos sejam feitos
sobre Índia e Brasil. Com relação à literatura americana deve-se chamar atenção
para o crescente numero de estudos que discutem os efeitos da eliminação das
ações afirmativas, dados que aumenta o número de Estados que tem proibido ações
afirmativas nos processos de admissão
. Os
resultados encontrados por Garces (2012) identificam efeitos negativos do
banimento das ações afirmativas em alguns estados americanos sobre a
representação de estudantes de cor na educação pós secundaria. De acordo com a
autora, a proibição nos estados do Texas, Califórnia, Washington, e Florida reduziu
cerca de 12% a proporção média de estudantes de cor em todos as áreas de graduação
incluídas na análise.
Bertrand et all (2010), analisam as ações
afirmativas no ensino superior indiano e propõem duas questões principais. A
primeira é investigar as propriedades dos objetivos da política de ação
afirmativa; a segunda saber se os candidatos minoritários que são favorecidos
pela política de ação afirmativa nas admissões realmente se beneficiam
economicamente com a participação na política, e se sim, como estes ganhos são
comparados com as perdas potenciais da maioria dos candidatos deslocados pela
política. Para responder às questões os autores coletaram dois bancos de dados,
um para levantar informações sobre todos os candidatos a admissão no curso de
engenharia em 1996 em um Estado da Índia, e outro banco a partir da entrevista
com 700 famílias do censo de 1996, candidatos e pais, entre 2004 e 2006, para
um melhor entendimento dos resultados entre grupos de castas.
Os resultados encontrados pelos autores mostram
que a despeito dos baixos escores de entrada, os entrantes de baixa casta tem
retorno de admissão positivo. Além disso, as estimativas encontradas sugerem
que esses ganhos podem vir a um custo absoluto porque as perdas de rendimento
experimentadas por candidatos de castas superiores deslocados são maiores do
que os ganhos de renda deslocando estudantes de castas inferiores. Os autores
chamam atenção para o fato de que o tamanho limitado da amostra nas
especificações impede de tirar conclusões fortes destes resultados do mercado
de trabalho.
Francis e Tannuri-Pianto (2012) analisam a
experiência da UNB na implementação do sistema de reserva de vagas por
critérios raciais em julho de 2004. A UNB reservava 20% das vagas para
estudantes que se auto-identificavam como negros. As informações utilizadas
para estimação foram levantadas por entrevistas com estudantes admitidos na
Universidade por meio de vestibular antes e depois da implantação das cotas,
entre 2003 e 2005. Foram levantados diversos tipos de informações, como
background familiar, expectativas, emprego, etc.
Os autores mostram que as cotas aumentaram
a proporção de estudantes negros e que os beneficiários da política vinham de
famílias de menor status socioeconômico do que os alunos não beneficiários. As
evidências encontradas sugerem que as cotas raciais não reduzem o esforço pré-universidade
dos estudantes e que pode existir razoável disparidade no desempenho acadêmico
entre estudantes em departamentos selecionados. Os autores identificaram ainda
que as cotas podem gerar um incentivo de deturpação da identidade racial ao
mesmo tempo em que inspira indivíduos, especialmente o de pele mais escura, a declararem-se
negros.
De
acordo com Krishna e Tarasov (2013), os trabalhos que analisam os efeitos das
ações afirmativas baseadas nas preferências raciais podem ser divididos em três
linhas: modelos de discriminação estatística
,
modelos de restrição de crédito e modelos de competição (
contests). Na primeira linha, dominante na literatura, o argumento
principal é de que considerando que a habilidade é não observada, mas
correlacionada com alguma característica observável como raça, a preferência
baseada na raça pode ser contraprodutiva ou mesmo criar desigualdade onde não
existe. O chamado efeito de
mismatch
então prevalece gerando resultados não desejados pela política de ação
afirmativa. Fang e Moro (2011) apresenta relação de artigos nesta linha.
A
segunda linha analisa a política de ações afirmativas como forma de mitigar o
acesso diferenciado à educação em decorrência das restrições de crédito. A
terceira linha analisa a política em um ambiente de competição entre os
estudantes. Em linhas gerais, os agentes competem para entrar na universidade
de modo que este esforço aumenta o desempenho a um certo custo, embora o desempenho
tenha um componente aleatório. A ação afirmativa, dando maior peso ao escore
das minorias, poderia aumentar o esforço de todos os agentes, e se esse é o
objetivo então a política pode ser desejável. Nesta linha podem ser citados os
trabalhos de Su (2005), Fu (2007) e Krishna e Tarasov (2013).
O
modelo de Su (2005) analisa o impacto da política de ações afirmativas no
acesso à educação superior nos EUA, considerando dois aspectos diferenciadores
dos demais modelos utilizados para avaliar o impacto desta política
.
O primeiro aspecto considerado refere-se à introdução da competição entre os
estudantes para ingressar na universidade, ou seja, na concorrência pelo
acesso. A Ação afirmativa pode introduzir mais competição entre os alunos,
induzindo mais esforço e levando a resultados de capital humano melhores para
todos os indivíduos, em ambos os grupos, beneficiários e não beneficiários da
política.
A
literatura nacional sobre o tema tem crescido consideravelmente. Santos (2012) realiza
um levantamento e análise da produção intelectual existente sobre o tema e
identifica que entre 2001 e 2011 a produção bibliográfica sobre a adoção de
ações afirmativas no ensino superior cresceu significativamente. Sem considerar
a publicação de livros, o autor identifica 232 trabalhos publicados, sendo 142
artigos, 71 dissertações e 19 teses. Santos argumenta que, além de crescente, a
produção acadêmica sobre o tema também tem sido regular. No período
considerado, a média de dissertações por ano foi 7,1; entre 2003 e 2010 a média
por ano foi de 15 artigos, sendo 2009 foi o ano mais expressivo, com 24
artigos.
Analisando alunos da UFBA, Lordêlo (2004) coloca
que o desempenho do estudante é uma função de multiplicidade que inclui fatores
externos e internos ao ambiente escolar e que indica a qualidade do ensino
prestado. Buscando construir o perfil do estudante do curso de Administração, o
autor conclui que este é um curso elitizado, com baixa frequência de negros e
pobres, o que mostra a necessidade de políticas promotoras da inclusão. Contudo,
Lordêlo coloca que uma política de ação afirmativa não seria suficiente para
garantir um bom desempenho durante o curso sendo necessária a combinação de algum
tipo de auxílio financeiro, ou seja, a efetivação das ações de permanência.
Maia et all (2009) propõe uma metodologia
para analisar a heterogeneidade do desempenho dos alunos da UNICAMP, do
ingresso à conclusão, considerando tipo de escola e gênero entre outros
fatores. A partir da analise de diversidade, intra e entre grupos, os autores avaliam
se existem diferenças de desempenho acadêmico entre alunos que fizeram ensino médio em escolas públicas e os
que estudaram em escolas particulares. Utilizado dados de 1997 a 2000 de 45
cursos, de todas as áreas de conhecimento, os resultados encontrados mostraram
que alunos oriundos de escolas públicas apresentaram uma melhor evolução
relativamente aos de escolas privadas no primeiro ano dos cursos.
Queiroz e Santos (2006) analisando a
política de reserva de vagas na UFBA, constataram que não existiam disparidades
de desempenho cotistas e não cotistas. Os autores concluíram que houve uma
perceptível inclusão de segmentos antes excluídos do ensino superior com a
adoção da política e que alunos cotistas têm condições de ter rendimento
satisfatório, o que inviabiliza o principal argumento contra as cotas.
Na mesma linha de Queiroz e Santos (2006),
Velloso (2009) compara a nota média dos alunos ingressantes pelo sistema de
reserva de vagas na UNB com a nota media dos demais ingressantes por vestibular
nos anos de 2004 a 2006. O autor compara o rendimento de cotistas e não
cotistas em cada carreira considerando o nível de prestigio social e área do conhecimento
do vestibular (Humanidades, Ciências e Saúde). Os resultados encontrados por
Velloso mostram que em cerca de dois terços das carreiras analisadas não há
diferenças expressivas entre as medias dos dois grupos ou estas foram favoráveis
aos cotistas. Estes resultados mostram, portanto, um efeito positivo da política
de cotas (reserva de vagas) sobre o desempenho acadêmico dos alunos.
Waltenberg e Carvalho (2012) traçaram um
perfil dos ingressantes nos cursos de graduação do Brasil com microdados do
Enade 2008, concluindo que o desempenho de estudantes participantes de Ações
Afirmativas são inferiores aos demais alunos nas instituições de ensino
superior pública. Eles interpretaram o resultado como o ônus que a sociedade
paga ao promover a diversidade e oportunidades. Nas instituições de ensino
superior privada, por outro lado, não apresenta um grande diferencial de
desempenho entre os beneficiados ou não por ações afirmativas, exceto em cursos
de alto prestígio (cursos da área I- Ciências Físicas, Matemática e
Tecnologia e II - Ciências
Biológicas e Profissões da Saúde).
Silva
Filho e Cunha (2013) fazem uma análise das políticas afirmativas sob a ótica
dos direitos humanos e equidade. Os autores também analisam alguns antecedentes
da implantação das políticas afirmativas no país e fazem um balanço dos estudos
sobre os programas existentes nas universidades públicas. Os autores enfatizam
os efeitos positivos da política sobre a promoção da igualdade ao mesmo tempo
em que identificam na literatura a necessidade de uma discussão mais
aprofundada da questão.
Analisando dados do Exame Nacional de
Desempenho dos Estudantes (ENADE), Perreira (2013) estima o impacto das cotas
sobre o desempenho dos alunos no ano de 2008 em 59 cursos. Para tanto, o autor
aplica o método de diferença-em-diferença (D-D) e o Propensity Matching Score (PMS). Os resultados mostram que a
implantação das cotas impactou de forma negativa e significante nos cursos de
Pedagogia, História e Física, e impactou positivamente e significante somente
no curso de Agronomia.
Este trabalho enquadra-se dentro desse
contexto e é parte de um projeto de pesquisa que busca avaliar as ações
afirmativas na Universidade Federal da Bahia. A análise aqui realizada
considera incialmente um dos eixos do programa de ações afirmativas na UFBA,
qual seja, o acesso pelo sistema de reserva de vagas. Mais especificamente
busca-se identificar se existe diferencial de desempenho entre alunos
ingressantes por meio das reserva de vagas e os demais alunos ingressantes por concorrência
ampla. Uma análise mais completa do programa requer além de testar a existência
de diferencial de desempenho, avaliar o desenvolvimento dos alunos cotistas,
doravante assim chamados, ao longo do curso em que estão matriculados, em
termos de frequência, aprovação e evasão. Esta análise complementar será feita
em trabalho futuro. A análise realizada é feita de forma geral para todos os
cursos da Universidade e por grandes áreas de conhecimento do vestibular. Os
dados, metodologia e resultados encontrados são apresentados nas sessões 4 e 5,
respectivamente.
4. DADOS, METODOLOGIA e resultados
Os dados utilizados
referem-se aos alunos matriculados nos cursos de graduação presencial da UFBA
entre os anos de 2010 a 2012. Os dados foram disponibilizados pela Pró-reitoria de Ensino de Graduação (PROGRAD)
da Universidade Federal da Bahia e extraídos do Sistema Acadêmico (SIAC)
da Universidade Federal da Bahia que é responsável pelo registro das notas. As
informações relativas ao questionário socioeconômico que os candidatos
preenchem na inscrição do vestibular foram disponibilizadas pelo Centro de Processamento de Dados da Universidade.
A amostra contem
46.011 observações (Tabela 1) para os três anos analisados e é composta apenas
pelos estudantes aprovados no vestibular e que se matricularam na universidade.
Os ingressantes através de transferência interna e externa, portadores de
diploma de nível superior, aluno especial e os bacharelados interdisciplinaresforam desconsiderados.
4.1.
ESTATÍSTICAS descritivas
Tabela 1 – Frequência de alunos da UFBA
por categoria de seleção e ano
Ano
|
Total de alunos
|
Não cotistas
|
Cotistas
|
2010
|
21.932
|
57,3
|
42,7
|
2011
|
16.816
|
60,9
|
39,1
|
2012
|
72.630
|
64,9
|
35,1
|
Total
|
46.011
|
59,8
|
40,2
|
Fonte:
Elaboração própria com dados da UFBA (2013)
Com relação ao desempenho dos dois tipos de categorias (cotistas e não
cotistas), duas estimativas básicas foram consideradas: o escore médio final do
vestibular e a nota média semestral. O escore final é a pontuação obtida pelo
aluno no vestibular. A nota média
representa as notas dos alunos em cada semestre, atribuindo zero àqueles que
foram reprovados por falta. A Tabela 2 mostra as médias dos escores finais e
nota média dos cotistas e não cotistas.
Tabela 2 - Escore final médio do
vestibular e nota média semestral por ano
Ano de Ingresso
|
Categoria
|
Escore Final no vestibular
|
DP EF
|
Nota Média
|
DP NM
|
2010
|
Não cotista
|
14.401,25
|
2077,16
|
6,27
|
2,44
|
Cotista
|
12.429,43
|
1577,40
|
5,75
|
2,46
|
Total
|
13.559,46
|
2118,03
|
6,05
|
2,46
|
2011
|
Não cotista
|
13.100,28
|
3314,29
|
5,76
|
2,57
|
Cotista
|
12.415,54
|
1546,87
|
5,52
|
2,41
|
Total
|
12.832,26
|
2780,82
|
5,66
|
2,51
|
2012
|
Não cotista
|
12.022,17
|
4121,71
|
5,77
|
2,51
|
Cotista
|
12.426,13
|
1581,20
|
5,68
|
2,35
|
Total
|
12.163,95
|
3455,41
|
5,74
|
2,46
|
Total
|
Não cotista
|
13.509,83
|
3125,71
|
5,99
|
2,51
|
Cotista
|
12.424,03
|
1567,06
|
5,66
|
2,43
|
Total
|
13.073,40
|
2667,09
|
5,86
|
2,49
|
Fonte: Elaboração
própria com dados da UFBA (2013)
Nota-se que de forma geral a média do escore final dos cotistas revela
que o desempenho destes são mais homogêneos, ou seja, apresentam desvio padrão
menores quando comparado à outra categoria. Na análise conjunta, os não
cotistas apresentam melhores médias de escore que os cotistas. No entanto, para
2012 os cotistas tiveram escore médio final no vestibular maior que os não
cotistas. Isto ocorreu para todas as áreas da universidade, o que de certo modo
corrobora com o modelo de Su (2005) apresentado anteriormente neste artigo.
Com relação a nota média semestral, observa-se que os não cotistas
tiveram desempenho melhor que a outra categoria em todos os anos (Tabela 2). Em
2010, os não cotistas tiveram nota média de 6,27 caindo no ano seguinte para
5,76 e se mantendo quase constante para 2012. Os cotistas, para o mesmo
período, tiveram nota média de 5,75; 5,52 e 5,68. Observa-se que os cotistas
conseguiram manter um desempenho próximo a média para o conjunto de anos
(5,66), diferentemente dos não cotistas. Entretanto, os desvios padrões de
ambas as categorias revelam que os rendimentos não foram muito heterogêneos.
Considerando escore final médio por gênero e categoria de seleção,
conforme apresentado na Tabela 3, observa-se que os alunos do sexo masculino
apresentaram melhor resultado do que os alunos do sexo feminino, tanto para
cotistas e não cotistas. No período considerado, o escore médio para não
cotistas do sexo masculino foi de 14.733,07 enquanto que o das mulheres não
cotistas foi 14.117,84. Este padrão se mantém em todos os anos. Observa-se da
mesma forma que os alunos cotistas do sexo masculino apresentaram melhor
resultado do que as alunas cotistas.
Tabela 3- Escore final médio do
vestibular e nota média semestral por gênero
Ano de Ingresso
|
Gênero
|
Cotas
|
Nº alunos
|
Escore Final
|
DP EF
|
Nota Média
|
DP NM
|
2010
|
Masculino (46,2%)
|
Não cotista
|
5790
|
14733,07
|
2074,53
|
5,94
|
2,53
|
Cotista
|
4341
|
12744,15
|
1707,11
|
5,32
|
2,58
|
Feminino (53,8%)
|
Não cotista
|
6779
|
14117,84
|
2037,20
|
6,56
|
2,32
|
Cotista
|
5022
|
12157,38
|
1400,27
|
6,13
|
2,29
|
2011
|
Masculino (46,4%)
|
Não cotista
|
4736
|
13308,09
|
3463,63
|
5,35
|
2,67
|
Cotista
|
3062
|
12662,31
|
1609,92
|
5,11
|
2,51
|
Feminino (53,6%)
|
Não cotista
|
5498
|
12921,26
|
3169,43
|
6,11
|
2,42
|
Cotista
|
3520
|
12200,89
|
1456,47
|
5,87
|
2,26
|
2012
|
Masculino (46,1%)
|
Não cotista
|
2142
|
12257,59
|
4125,84
|
5,39
|
2,65
|
Cotista
|
1204
|
12723,98
|
1705,61
|
5,36
|
2,51
|
Feminino (53,9%)
|
Não cotista
|
2572
|
11826,11
|
4108,77
|
6,09
|
2,34
|
Cotista
|
1345
|
12159,51
|
1409,05
|
5,97
|
2,15
|
Total
|
Masculino (46,2%)
|
Não cotista
|
12668
|
13781,76
|
3196,70
|
5,62
|
2,62
|
Cotista
|
8607
|
12712,21
|
1673,20
|
5,25
|
2,55
|
Feminino (53,8%)
|
Não cotista
|
14849
|
13277,84
|
3044,83
|
6,31
|
2,37
|
Cotista
|
9887
|
12173,16
|
1421,72
|
6,02
|
2,26
|
Fonte: Elaboração
própria com dados da UFBA (2013)
Com
relação às notas médias, o gênero feminino apresenta melhores notas que o
gênero masculino. Os estudantes do sexo masculino cotistas, na análise global,
tiveram nota média de 5,25 enquanto as do sexo feminino 6,02. Os estudantes do
sexo masculino não cotistas tiveram nota média de 5,62 e as do sexo feminino
6,31. Ressalta-se que as mulheres cotistas apresentaram melhor desempenho
inclusive na comparação com os homens não cotistas para todo o período considerado.
A
tabela 4 apresenta o escore médio do vestibular e a nota média semestral por
área de conhecimento. Nota-se que a área I é área em que apresenta a maior
diferença de nota média dos cotistas em relação aos dos não cotistas, esta
diferença é vista também no escore médio do vestibular. Nas áreas II (Ciências
Biológicas e Profissões da Saúde) e III (Filosofia e Ciências Humanas),
porém são menores quando comparado à área I (Ciências Físicas, Matemática e
Tecnologia). Para as áreas IV (Letras) e V (Artes), no entanto, os cotistas
apresentam melhor escore médio no vestibular que os não cotistas, porém na
análise para a nota média ocorre o inverso, com os cotistas apresentando melhor
desempenho.
Tabela 4 – Escore final médio do vestibular
e nota média semestral por área
Área
|
Categoria
|
Nº alunos
|
Escore médio do
vestibular
|
DP EF
|
Nota Média
|
DP NM
|
I - Ciências Físicas,
Matemática e Tecnologia
|
Não cotista
|
8231
|
13684,84
|
3141,94
|
5,44
|
2,45
|
Cotista
|
4824
|
12189,69
|
1333,40
|
4,67
|
2,35
|
II - Ciências Biológicas e
Profissões da Saúde
|
Não cotista
|
6926
|
13342,24
|
3299,63
|
6,41
|
2,07
|
Cotista
|
4883
|
12379,49
|
1671,10
|
6,00
|
1,98
|
III – Filosofia e Ciências Humanas
|
Não cotista
|
8972
|
13199,14
|
3064,28
|
6,30
|
2,57
|
Cotista
|
6615
|
12353,12
|
1309,05
|
6,06
|
2,49
|
IV - Letras
|
Não cotista
|
1630
|
12498,44
|
1801,50
|
5,42
|
2,92
|
Cotista
|
1163
|
11629,73
|
937,69
|
5,49
|
2,56
|
V- Artes
|
Não cotista
|
1758
|
15874,08
|
2369,32
|
5,94
|
3,07
|
Cotista
|
1009
|
15140,40
|
1530,83
|
6,33
|
2,80
|
Fonte:
Elaboração própria com dados da UFBA (2013)
A Tabela 5 apresenta
algumas das variáveis presentes no banco de dados relativas ao perfil sócio
econômico da amostra. É interessante salientar que uma das exigências para o estudante participar da política de cotas da
UFBA era ter estudado todo o ensino médio em pelo menos um ano do ensino
fundamental em escola pública. Dos ingressantes em 2010, observa-se que o maior
percentual de não cotistas foi oriundo de escolas públicas (57,3%) e que isto
diminuiu em 2011 (27,3%), mas cresceu um pouco em 2012 (30,2%). Sobre os
cotistas, de modo geral, apresentam maior média de idade que os não cotistas e
percentuais inferiores sobre as informações relativas a características
relacionadas com a renda (computador pessoal e automóvel próprio).
Tabela 5-Frequência de variáveis
selecionadas por ano e categoria de seleção
Ano de Ingresso
|
Total de Alunos
|
Categoria
|
Escola Pública
|
Computador pessoal ou familiar
|
Automóvel para uso pessoal
|
Sexo feminino
|
Idade (média)
|
Escore Final (média)
|
2010
|
21932
|
Não cotistas
|
57,3
|
91,1
|
25,2
|
53,9
|
20,9
|
14401,25
|
Cotistas
|
100,0
|
80,3
|
16,0
|
53,6
|
22,4
|
12429,43
|
2011
|
16816
|
Não cotistas
|
27,3
|
93,6
|
18,8
|
53,7
|
21,2
|
13100,28
|
Cotistas
|
100,0
|
76,0
|
10,1
|
53,5
|
22,7
|
12415,54
|
2012
|
7263
|
Não cotistas
|
30,2
|
93,5
|
21,9
|
54,6
|
20,6
|
12022,17
|
Cotistas
|
100,0
|
80,6
|
11,6
|
52,8
|
22,1
|
12426,13
|
Fonte:
Elaboração própria com dados da UFBA (2013)
E por fim, a Tabela 6 informa as notas médias
das duas categorias de seleção por semestre cursado. No primeiro semestre, os
cotistas apresentam o melhor rendimento e este vai declinar até o terceiro
semestre, quando novamente passam a ter rendimentos melhores. Os alunos não
cotistas apresentam melhores notas médias no segundo semestre e nos demais
semestre apresentam pequenas oscilações de rendimento.
Tabela 6 - Nota média por semestre de
2010 a 2012
Categoria
|
Semestres cursado
|
Nota Média
|
Desvio padrão
|
Não cotista
|
1
|
6,03
|
2,47
|
2
|
6,05
|
2,46
|
3
|
5,88
|
2,47
|
4
|
5,97
|
2,65
|
5
|
5,96
|
2,55
|
6
|
6,02
|
2,70
|
Total
|
6,00
|
2,51
|
Cotistas
|
1
|
5,81
|
2,35
|
2
|
5,76
|
2,33
|
3
|
5,46
|
2,45
|
4
|
5,54
|
2,55
|
5
|
5,55
|
2,52
|
6
|
5,67
|
2,63
|
Total
|
5,66
|
2,43
|
Fonte: Elaboração própria com dados
da UFBA (2013)
Em resumo, observou-se que a média do escore final dos
não cotistas são maiores que os dos cotistas, tendo o gênero masculino melhores
desempenhos com relação ao feminino. No que se refere a nota média semestral,
os cotistas tem médias menores que os não cotistas, quanto ao gênero, o
feminino tem melhores médias que o masculino.
4.2.
metodologia
O método de investigação utilizado para estimar o
impacto das cotas sobre a nota média semestral será o modelo dos Mínimos
Quadrados Ordinários (MQO). De
acordo com Wooldridge (2012), o método MQO consiste em encontrar as estimativas
que minimizem a soma dos quadrados dos resíduos. Considerando a seguinte
equação:
(2)
Em que
é chamado parâmetro de intercepto ou coeficiente linear;
é o parâmetro coeficiente angular; e
o é o termo de erro.
E a mesma equação estimada:
(3)
O resíduo para a observação i é a diferença entre o valor verdadeiro de
e seu valor estimado (
):
(4)
As estimativas de MQO são escolhidas para que a soma
dos quadrados dos resíduos sejam mínimas:
(5)
As estimativas possuem algumas propriedades ótimas
contidas no Teorema de Gauss-Markov. Este
justifica o uso do método dos mínimos quadrados em relação a outros estimadores
possíveis. São cinco as hipóteses de Gauss-Markov.
Hipótese 1: Linear em
parâmetros. A variável dependente, y, relaciona-se com a variável independente,
x, e com o termo de erro, u; Hipótese 2: Amostragem aleatória. Uma amostra de n observações; Hipótese 3: Colinearidade imperfeita. Nenhuma das variáveis
independentes é constante na amostra; Hipótese 4: Média condicional zero. O
termo de erro tem valor igual a zero para quaisquer valores das variáveis
independentes; Hipótese 5: Homocedasticidade. O erro tem a mesma variância para
quaisquer valores das variáveis explicativas. Sob as hipóteses de Gauss-Markov,
os estimadores de MQO são os melhores estimadores lineares não viesados
(WOOLDRIDGE, 2012).
Para analisar o efeito de ser cotista na nota média
semestral, utilizou-se o seguinte modelo:
A variável nota representa o desempenho
acadêmico, cotas é uma dummy, em que
ser cotista é igual a um e não ser cotista é igual zero. Além dessas variáveis
foram utilizadas outras como variáveis de controle, tais como: número de
semestre, que indica os semestres cursados; escore final, o qual representa o
escore final do vestibular; feminino, que é uma dummy que se o valor for igual a um representa gênero feminino e,
se valor igual a zero é gênero masculino; doutorado, que indica a quantidade de
doutores na universidade; renda de cinco salários mínimos, que também é uma dummy, em que se a renda familiar dos
estudantes é acima de cinco salários mínimos assume valor igual a um e, se
abaixo, assume valor zero; filhos é outra dummy,
em que se valor igual a um, o estudante tem filho, e se valor zero não
tem. A Tabela 7 resume as descrições de
todas as variáveis utilizadas na estimação.
Tabela
7-Descrição das variáveis
Variáveis
|
Descrição
|
Nº Observações
|
Média
|
Desvio padrão
|
Min
|
Max
|
nota
|
Nota média por semestre
|
46011
|
5,86
|
2.485.903
|
0
|
10
|
escfinal
|
Escore final vestibular
|
46011
|
13073,40
|
2.667.091
|
5065,10
|
20756,20
|
idade
|
Idade de ingresso na Universidade
|
45962
|
21,56
|
6.493.797
|
1
|
67
|
feminino
|
Se gênero feminino, feminino = 1
|
46011
|
.5376106
|
.4985889
|
0
|
1
|
cotas
|
Se cotista, cotas = 1
|
46011
|
.4019474
|
.4902968
|
0
|
1
|
doutorado
|
Se doutor, doutorado=1
|
46011
|
.5138308
|
.2615987
|
0
|
1
|
renda5sm
|
Se tem renda maior que 5 SM, renda5sm=1
|
46011
|
.3102084
|
.4625838
|
0
|
1
|
numsemetres
|
Número de semestre
|
46011
|
2.637.847
|
1.490.362
|
1
|
6
|
Fonte:
Elaboração própria com dados da UFBA (2013)
4.3. RESULTADOS
Para
averiguar a existência de um possível diferencial de desempenho entre os alunos
cotistas e não cotistas, foi realizado um teste de médias por categorias,
conforme apresentado na Figura 2. Os resultados preliminares, baseados na nota
semestral
indicam que existe diferença de notas entre cotistas e não cotistas. Recorre-se ao teste t para testar a hipótese
nula que não existe diferença na nota média dos não cotistas e cotistas, com
nível de significância de 1% apresentando os seguintes resultados para os três
anos:
Figura 2 - Teste t da nota média
semestral para cotistas e não cotista
Fonte: Elaboração própria com dados da UFBA (2013)
Para um teste bicaudal com
nível de significância de 1% e graus de liberdade grande (>120), o valor
crítico é de 2,576. Isto indica que a hipótese nula será rejeitada se a
estatística t for maior que o valor crítico. Na amostra analisada, a
estatística t é 9.6170, logo a diferença de nota semestral entre os dois grupos
é estatisticamente significante ao nível de 1%. Entretanto, quando se faz a
análise por área de conhecimento, o teste t apresenta o mesmo resultado apenas
nas áreas I, II e III, enquanto que para as áreas IV e V a estatística t é
menor que o valor crítico, deste modo não é possível rejeitar a hipótese nula
no nível de significância de 1% (APÊNDICE C).
Os resultados obtidos com
a estimação de ser cotista sobre a nota
semestral média de cada semestre em comparação com os alunos não cotistas através do método dos Mínimos Quadrados Ordinários com dados
agrupados são apresentados na Tabela 8.
Tabela 8 - Resultado das Estimações
Variável
dependente: Nota média semestral
|
|
Variáveis
independentes
|
Geral
|
Área I
|
Área II
|
Área III
|
Área IV
|
Área V
|
|
|
Cotas
|
-0.0782**
|
-0.279***
|
-0.169***
|
-0.0752
|
0.341**
|
0.500***
|
|
(-3.20)
|
(-5.98)
|
(-4.28)
|
(-1.78)
|
(3.12)
|
(4.02)
|
|
numsemestres
|
-0.1000***
|
-0.0893***
|
-0.0367**
|
-0.105***
|
-0.197***
|
-0.180***
|
|
(-12.78)
|
(-6.22)
|
(-2.86)
|
(-7.74)
|
(-5.40)
|
(-4.75)
|
|
escfinal
|
0.000246***
|
0.000301***
|
0.000227***
|
0.000229***
|
0.000320***
|
0.000102***
|
|
(57.04)
|
(38.12)
|
(36.59)
|
(27.64)
|
(8.92)
|
(3.72)
|
|
feminino
|
0.813***
|
0.379***
|
0.497***
|
0.925***
|
0.365**
|
0.618***
|
|
(36.04)
|
(9.23)
|
(12.05)
|
(23.04)
|
(3.19)
|
(5.44)
|
|
doutorado
|
0.436***
|
0.415***
|
-0.493***
|
0.378***
|
-0.281
|
0.671**
|
|
(8.88)
|
(4.33)
|
(-4.67)
|
(4.87)
|
(-1.14)
|
(3.08)
|
|
renda5sm
|
0.134***
|
0.142**
|
-0.00522
|
0.181***
|
0.133
|
0.101
|
|
(5.02)
|
(2.79)
|
(-0.12)
|
(3.86)
|
(1.21)
|
(0.76)
|
|
filhos
|
-0.869***
|
-1.623***
|
-0.345*
|
-0.817***
|
-0.736***
|
-0.575**
|
|
(-12.96)
|
(-12.14)
|
(-2.22)
|
(-7.87)
|
(-3.97)
|
(-2.58)
|
|
_cons
|
2.273***
|
1.243***
|
3.415***
|
2.826***
|
1.879***
|
4.259***
|
|
(32.11)
|
(9.89)
|
(28.77)
|
(21.37)
|
(3.87)
|
(8.76)
|
|
N
|
46011
|
13055
|
11809
|
15587
|
2793
|
2767
|
|
R-sq
|
0.097
|
0.148
|
0.106
|
0.088
|
0.045
|
0.031
|
|
F
|
725.1
|
325.9
|
248.8
|
214.8
|
19.03
|
12.71
|
|
Estatística t em
parênteses
|
|
* p<0.05, **
p<0.01, *** p<0.001
|
|
Fonte:
Elaboração própria com dados da UFBA (2013)
O sinal da estimativa do coeficiente de inclinação
de cotas ratifica o observado na descrição
dos dados da seção anterior. Mantendo as
demais variáveis fixas, a variação em cotas
indica que o aluno cotista tem sua
nota reduzida em 0,0782 em relação a um aluno não cotista. Desta forma é
possível perceber que os cotistas tem rendimento inferior aos não cotistas
mesmo que o escore final de classificação no vestibular (escfinal) tenha sido igual para ambas as categorias.
A variável numsemestres mostra que à medida que o
aluno avança nos semestres sua nota mediana reduz em 0,1 décimo em ambas
categorias. As atividades extracurriculares, como estágios, necessárias para a
formação complementar do aluno, pode ser uma justificativa na diminuição das
notas médias no decorrer dos cursos.
A mesma interpretação pode ser
aplicada a variável filhos, desta
forma, ter filhos diminui em 86,9% a nota média semestral. Esta diminuição
percentual bastante expressiva é plausível, pois estudantes com filhos tem
tempo disponível menor que os estudantes sem filhos, podendo implicar em um
esforço maior que nem sempre é possível para esses estudantes.
O coeficiente da variável escfinal (0.000246) indica que o escore final
médio do vestibular tem participação modesta sobre a nota média semestral do
estudante. Significando que, mantendo as demais variáveis constantes, os alunos
que tiveram escore final alto não terão necessariamente notas médias maiores.
A variável feminino é uma variável dummy e o coeficiente estimado mensura a
diferença ceteris paribus entre os
dois gêneros (feminino e masculino). A variável tem coeficiente positivo e
indica que os alunos do gênero feminino tem nota média semestral 81,3% maior
que os do gênero masculino. A análise descritiva já havia sinalizado que apesar
dos homens apresentaram escore médio final do vestibular maior isto não é
mantido com o ingresso na universidade.
O coeficiente positivo da
variável doutorado é interessante,
pois indica que professores com doutorado influenciam positivamente na nota do
aluno. Ter professores com doutorado representa um aumento percentual de 43,6%
nos rendimentos dos alunos cotistas e não cotistas. Este resultado ratifica uma
das implicações do modelo de Bishop (2006) em que sinalizava a relação positiva
da qualidade do professor com o esforço do aluno.
A variável renda5sm mostra que os
estudantes com renda familiar maior que cinco salários mínimos têm notas médias
semestrais maiores que aqueles com renda menor. Uma das possíveis causas é que
os estudantes de menor renda familiar podem ter que trabalhar para completar os
rendimentos da família, interferindo diretamente no tempo dedicado aos estudos.
Na análise por áreas de conhecimento, as estatísticas apresentam
resultados diferentes da análise conjunta. Paras áreas I e II ser cotista reduz
a nota média em 27,9% e 16,9% respectivamente, estas são as áreas que
apresentam maior diferencial de notas entre cotistas e não cotistas. No
entanto, para as áreas IV e V, a variável cotas tem o coeficiente positivo, o
que significa que os cotistas nestas áreas possuem nota média semestral
superiores aos dos não cotistas. Estas diferenças podem ser atribuídas à
influência de variáveis não observadas como os padrões de avaliação dos cursos
de acordo com a área.
As variáveis numsemestres, escfinal, feminino e filhos apresentam comportamento por área de conhecimento semelhante
ao comportamento na análise conjunta. No entanto, a variável doutorado tem coeficiente negativo para as áreas II
e IV, o que difere da implicação para o conjunto de áreas. Como os dados são
agregados e cada área de conhecimento tem cursos com características
particulares, às razões para os quais professores mais qualificados
apresentarem impacto negativo na nota média semestral requer investigações mais
aprofundadas.
Os resultados globais mostram que mesmo após o controle das
demais variáveis o cotista apresenta desempenho inferior ao do não cotista na
universidade. No início do curso, o estudante tem melhor desempenho e este
tende a diminuir ao longo da vida acadêmica para ambas as categorias.
Estudantes com filhos têm notas médias menores que aqueles que não têm e as
mulheres apresentam melhores médias. O escore do vestibular não tem muita influencia
sobre a nota média enquanto ter renda familiar maior do que cinco salários
mínimos e ter professores com doutorado também influência positivamente o
desempenho dos alunos.
A crescente literatura teórica e empírica sobre as ações
afirmativas evidencia de forma clara a relevância que a temática assume para as
sociedades. As ações afirmativas podem ser compreendidas como um conjunto de
medidas que buscam criar condições para reduzir e ou prevenir discriminação
contra determinados grupos sociais historicamente excluídos e promover uma igualdade
de oportunidade. A relevância das ações afirmativas amplia-se ainda mais quando
consideramos o papel que a educação assume para o crescimento e desenvolvimento
econômico de qualquer país no mundo.
A elaboração de políticas públicas com o objetivo de
aumentar a oferta, o acesso e a qualidade da educação é fundamental para
trajetória econômica estável e positiva. Ainda que não seja uma política
exclusivamente educacional, as Ações Afirmativas surgem em um contexto de
desigualdade em que parte da sociedade encontra-se em desvantagem em relação
aos demais, não tendo portanto acesso a educação, em particular ao ensino
superior.
Se considerado que a formação do capital humano de uma
sociedade e o desenvolvimento tecnológico ocorre principalmente dentro das
universidades, pela qualificação e treinamento dos indivíduos, as ações
afirmativas assumem importância ainda maior na medida em que permite a uma
grande parcela da população, antes excluída desse processo de formação do
capital humano, ter condições de se qualificar e contribuir para o crescimento
e desenvolvimento econômico do país. Nesse sentido, esta política deve ser
vista além de importante mecanismo de reparação social e histórica de grupos
minoritários da sociedade, mas principalmente como politica que possibilita a
sociedade formar, qualificar uma parcela da sociedade que se não fosse pela
política não teriam acesso à universidade. das sociedades.
A despeito desta perspectiva a literatura não apresenta um
consenso a cerca dos efeitos que as ações afirmativas geram sobre os indivíduos
e as sociedades. Este artigo coloca-se exatamente dentro desse contexto
buscando identificar quais os impactos sobre o desempenho dos alunos tal
política pode gerar. O trabalho apresentou uma analise do programa de ações
afirmativas existente na Universidade Federal da Bahia, particularmente do
sistema de reserva de vagas. De forma geral e por grandes áreas de conhecimento
do vestibular, buscou-se avaliar o impacto da política de cotas por meio dos
diferenciais de desempenho entre alunos cotistas e não cotistas, utilizando a
nota média semestral de cada aluno como medida de desempenho no ensino
superior. Os resultados indicaram haver diferencial contra os cotistas de forma
geral e a favor dos cotistas quando considerado por áreas para o grupo de Artes
e Letras.
Outro aspecto observado relevante foi que a média do escore
final do vestibular dos estudantes que, em geral, são maiores para os não
cotistas, mas em 2012 apresentou uma inversão, tendo os cotistas melhores
desempenhos tanto no global para o ano, quanto por área de conhecimento. Este
fato carece de mais cuidado, devendo ser feita posteriormente, para que assim
possam ser formuladas conclusões mais consistentes, visto que essa informação
gera implicações para a própria forma como a política de cotas foi estabelecida
na universidade.
Ainda que os resultados apresentados sejam caráter preliminar, necessitando serem completados com
análises mais específicas, já permite tecer alguns comentários. De alguma
forma, os resultados revelam que o problema relacionado ao baixo desempenho dos
estudantes cotistas, relativamente aos demais não cotistas, parece anteceder à
própria entrada na Universidade. Considerando que o processo educacional é
inerentemente hierárquico, ou seja, etapas precisam ser cumpridas com sucesso
para que ocorra o avanço, se o ensino básico, e mais especificamente o ensino
médio, apresenta baixa qualidade, certamente isto se refletirá no desempenho
dos alunos na universidade. Este parece ser o caso principalmente das áreas de
exatas, por exemplo, em que a hierarquia do processo mostra-se clara na
organização das disciplinas.
Adicionalmente
deve-se colocar que estes resultados não evidenciam que esta política seja um
fracasso, mas que os alunos cotistas não conseguem acompanhar o desempenho dos
não cotistas em algumas áreas. Mesmo porque, para considerar o sucesso ou fracasso
da política é necessário avaliar o conjunto completo de medidas adotadas e seus
efeitos privados e sociais, ou seja, em termos de desempenho do aluno e
inserção no mercado de trabalho bem como todos os benefícios e custos sociais
da implantação desta política. A perspectiva de trabalho futuro é de testar a
hipótese de mismatch considerando a
retenção e evasão dos alunos cotistas na UFBA. Nesta perspectiva, a análise
deve buscar compreender de que forma os incentivos criados pelas ações
afirmativas no ensino superior agem sobre as decisões dos indivíduos,
principalmente ao esforço dedicado a sua educação, o que permitirá uma analise
mais completa a cerca da eficácia e eficiência desta política.
Por fim, mas não menos
importante, o reconhecimento de que existem diferenciais entre cotistas e não
cotistas ao mesmo tempo em que parece evidenciar desigualdade de oportunidades
previamente existentes, revela a necessidade de medidas complementares para
alcançar os objetivos propostos. A percepção das desigualdades prévias coloca
em discussão se a polítca de ações afirmativas deve ter ou não caráter
temporário como forma de buscar tornar
iguais os que são culturalmente, demograficamente, historicamente desiguais a
séculos. Como coloca Sowell (p.7,
2004), a mudança na
condição socioeconômica destes grupos minoritários na educação superior não
pode acontecer sem mudanças estruturais que lhe permita, enquanto cidadãos,
iguais condições de exercer sua cidadania, ou seja, oportunidades iguais para
todos.
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